Tónicos, vitaminas e estimulantes

 

Em muitas ocasiões os doentes queixam-se ao psiquiatra de falta de forças, ou de menor capacidade de concentração. Isso resulta geralmente de fadiga, sobrecarga de trabalho, tensão permanente ou falta de um sono reparador. Muitas vezes existe um estado depressivo. Estas situações clínicas devem ser tratadas com os meios adequados para cada uma delas. Tratando-se a depressão, a insónia ou a ansiedade, o doente deixa de referir falta de capacidades mentais. Muitas vezes deve-se propor ao doente que mude alguns hábitos: corrija a sua alimentação, faça mais exercício físico, deite-se mais cedo e durma as horas convenientes. Por isso, medicar com tónicos e estimulantes é inútil e até pode ser perigoso, como veremos.

 

                Vitaminas

A medicação com suplementos vitamínicos e minerais pode ser vantajosa em algumas situações clínicas. Por exemplo, nos estados de astenia após infecções agudas, nas pessoas que se alimentam mal, ou naquelas que tomaram outras substâncias que podem ocasionar carência (como por exemplo o álcool ou certos antibióticos). Também nas pessoas idosas ou fragilizadas pode haver má absorção e carência relativa de importantes componentes da alimentação. Mas em muitíssimos casos em que o doente se sente “fraco”, as vitaminas são absolutamente inúteis.

Existe a ideia errada de que as vitaminas dão força ou energia... Isso só é verdade quando existe uma real carência vitamínica, como por exemplo no escorbuto, na pelagra ou no raquitismo, situações que hoje em dia só raramente se encontram. Na maioria das situações comuns, o organismo não tem necessidade destas substâncias, que são assim eliminadas... e até podem fazer mal, quando em excesso. Também é falso que as vitaminas, quando tomadas por pessoas saudáveis, as façam crescer ou ganhar peso.

Nas depressões, a falta de energia deve ser tratada com medicamentos anti-depressores, boa alimentação, repouso adequado e vida mais gratificante. Eventualmente poderão estar indicadas vitaminas, para consolidar o efeito terapêutico. Mas é pura ilusão pensar que a energia e a boa disposição vêm directamente das vitaminas. No entanto, os doentes ficam bem impressionados com os nomes sonantes destas especialidade: Bê-Supra, Bêdoze Fortíssimo, etc.

 

                Tónicos

Na sua grande maioria, os produtos conhecidos como “tónicos” não têm eficácia alguma comprovada. Exemplos: Fosfo-Astenil, Cerebrolysine, Dinistenile. Outros poderão ter algum efeito em situações de debilidade física ou fadiga, como os aspartatos – Sargenor e similares.

Alguns causam frequentemente sensibilização alérgica ou outras doenças. É o caso da bem conhecida Trifosfaneurina, um derivado da vitamina B1, que só está realmente indicado em situações graves de intoxicação alcoólica, avitaminoses ou nevrites, circunstâncias raras e que não são aquelas para as quais vulgarmente se receita esse produto. A Trifosfaneurina, além de geralmente inútil, é perigosa: pode causar sensibilização alérgica e já temprovocado reacções graves de intolerância. Assim se conclui que os riscos são mais que as vantagens (poucas ou nenhumas).

Com alguma frequência os médicos prescrevem aos seus doentes medicamentos que não têm actividade farmacológica específica na sua situação clínica. Fazem-no com o intuito de causar uma melhoria por efeito sugestivo: dando ao paciente a sensação de estar a ser tratado, incutem-lhe confiança e expectativa de cura, o que pode ser benéfico para a sua recuperação. Esses medicamentos designam-se por placebos, que quer dizer remédios “para agradar”. Antigamente eram pílulas cor-de-rosa ou cobertas de folha de ouro (daí a expressão “dourar a pílula”). Hoje são as vitaminas, os tónicos e os remédios com nome sugestivo.

Actualmente já não se justifica recorrer tão amplamente aos placebos como no passado, quando não existiam medicamentos eficazes. Como vemos, alguns são apenas inúteis, embora eventualmente caros. Mas outros têm mais inconvenientes que vantagens.

               

                Estimulantes cerebrais

Há mais de sessenta anos que deveria ter-se deixado de receitar fósforo para a falta de memória e a astenia, mas a tradição tem muita força... Na verdade, nunca se provou que esses compostos tivessem qualquer efeito positivo. E podem mostrar toxicidade, por exemplo para o fígado.

O mesmo se pode afirmar dos derivados do ácido glutâmico, que começaram a ser usados há quase cem anos na base de um equívoco, e continuam ainda a vender-se com vários nomes (Fosfoglutina ...).

A Cerebrolysine temsido muito usada em estudantes e pessoas fatigadas ou com queixas de falta de concentração. Nunca se provou que tivesse qualquer efeito benéfico nessas situações. Recentemente foi sugerido que poderia ser usada na doença de Alzheimer, há alguns indícios positivos, mas nada ficou demonstrado.

Bem mais perigosos são certos estimulantes prescritos frequentemente hoje em dia, que na realidade excitam o doente, lhe prejudicam o sono, e até induzem ansiedade e ataques de pânico. Por exemplo, o Cogitum. Estes produtos são até capazes de desencadear estados de delírio e alucinações em pessoas frágeis e predispostas. Note-se, a propósito, que muitos medicamentos supostamente inofensivos e até desintoxicantes, como o Guronsan, contêm cafeína (incluída com outro nome na composição) em dose suficientemente alta para provocar ansiedade e insónia.

Sabe-se que a cafeína estimula fortemente o cérebro, favorecendo a vigília e a atenção, quando em doses não excessivas. Mas tem outros efeitos no organismo, por exemplo sobre o coração e a tensão arterial. E causa sensível dependência física. Alguns alimentos e bebidas têm na sua composição cafeína ou substâncias análogas. Certos medicamentos têm teofilina, um fármaco com alguns efeitos semelhantes. Se em pessoas saudáveis uma tomada de cafeína em baixa dose (e a horas apropriadas) pode ser admissível, já em pessoas ansiosas, com perturbação do sono, hipertensas ou com outra patologia cardiovascular deverá evitar-se o seu uso.